
Numa entrevista, em 1948, perguntaram a Graciliano, como se devia escrever:
“Deve-se escrever, da mesma maneira como as lavadeiras lá de Alagoas fazem o seu
ofício. Elas começam com uma primeira lavada, molham a roupa suja na beira da lagoa ou
do riacho, torcem o pano, molham-no novamente, voltam a torcer. Colocam o anil,
ensaboam e torcem uma, duas vezes. Depois enxáguam, dão mais uma molhada, agora
jogando a água com a mão. Batem o pano na laje ou na pedra limpa, e dão mais uma
torcida e mais outra, torcem até não pingar do pano uma só gota.
Somente depois de feito tudo isso é que elas dependuram a roupa lavada na corda
ou no varal, para secar. Pois quem se mete a escrever devia fazer a mesma coisa.
A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi
feita para dizer.”
02 - Graciliano Ramos era ateu convicto, mas tinha uma Bíblia na cabeceira só para
apreciar os ensinamentos e os elementos de retórica. Por insistência da sogra, casou
na igreja com Maria Augusta, católica fervorosa, mas exigiu que a cerimônia ficasse
restrita aos pais do casal.
03 - A meninice desse grande romancista brasileiro foi pontuada por muita violência.
Em seu livro autobiográfico, Infância (1945), ele narra numerosos episódios de
brutalidade protagonizada pelo seu pai. No fragmento abaixo, que extraí do livro,
Graciliano narra uma delas, de quando ele tinha quatro anos:
“A mão cabeluda prendeu-me, arrastou-me para o meio da sala, a folha de couro
fustigou-me as costas. Uivos, alaridos inútil, estertor. Já então eu devia saber que
rogos e adulações exasperavam o algoz... (...) Solto, fui enroscar-me perto dos
caixões, coçar as pisaduras, engolir os soluços, gemer baixinho e embalar-me em
gemidos... (...) Sozinho, vi-o (o pai) de novo cruel e forte, soprando, espumando. E
ali permaneci, miúdo, insignificante, tão insignificante e miúdo como as aranhas que
trabalhavam na telha negra. Foi esse o primeiro contato que tive com a justiça”.
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